Coisas que eu aprendi em 1 ano de Suíça

Quando a gente tava na Armênia, eu fiz um post falando um pouquinho das coisas que tinha aprendido nos primeiros 6 meses por lá. Depois de 1 ano na Suíça, mesmo já tendo dado uns spoilers dos meus aprendizados por aqui nesse primeiro ano muito louco, resolvi escrever um post só pra listar as principais coisas que aprendi até agora.

Como qualquer outro lugar do mundo, a Suíça também tem problemas.

Eu sou do time que arranca logo o band-aid, então já trago essa verdade no primeiro tópico. A gente tem o costume de idealizar a vida em alguns lugares, e a Suíça costuma ser citada como um dos lugares mais maravilhosos do mundo. De fato, as belezas naturais desse país são inacreditáveis, beirando a perfeição. A arquitetura também encanta, principalmente nos centros históricos. A Suíça deve ser o único país do mundo em que o cartão-postal é realmente idêntico, retrato fiel da realidade. Mas, como qualquer outro lugar do mundo, o dia a dia é desafiador e apresenta problemas. O setor de serviços é bem ruim de uma maneira geral, desde demorar pra fazer a internet funcionar até atrasos em entregas programadas, passando pela TV a cabo sem tecla SAP. Aqui em casa, por exemplo, demoramos quase 9 meses pra conseguir concluir o processo de troca das persianas de alumínio de enrolar externas de dois dos quartos; foi tão traumático que, há poucas semanas, a persiana externa da sala de TV deu problema e a gente simplesmente comunicou à imobiliária pedindo pelo-amor-de-Deus pra eles deixarem assim porque a gente não quer passar por esse perrengue de novo (pelo menos, não tão cedo). Nem tudo funciona como um reloginho: desde atraso em entrega dos correios, ou entrega de supermercado, ou mesmo atrasos nos ônibus e trens, até marcar de fazerem um serviço em casa e simplesmente não aparecerem, tudo isso pode acontecer aqui como em qualquer outro lugar do mundo.

PS: aqui na Suíça é muito comum que os apartamentos/casas tenham a sala de jantar num cômodo separado da sala de estar; nós optamos por transformar esse cômodo imaginado pra ser a sala de jantar em uma sala de tv, e juntar a área estar com área de jantar no mesmo ambiente.

Pra economizar, é preciso planejamento.

A Suíça é um país muito caro, e isso não é novidade pra ninguém. Sem planejamento, é impossível economizar por aqui. E planejamento, nesse caso, precisa ir muito além de estipular uma meta de gastos mensais e uma meta de poupança: na maior parte das vezes, as maiores economias são feitas quando se consegue comprar um mini-estoque de coisas que estão com desconto. Nos mercados, por exemplo, é preciso ficar de olho nas promoções para aproveitar os preços mais baixos de artigos não-perecíveis (de papel higiênico a detergente, de papel toalha a sabão em pó). O mesmo vale pra dermocosméticos, por exemplo, já que algumas farmácias on-line oferecem descontos de até 20% de tempos em tempos. Outro jeito de economizar é se inscrevendo em todos os tipos de programa de fidelidade das lojas, farmácias, mercados, etc: muitos oferecem cashback de acordo com a quantia gasta, frete grátis, cupons de desconto, entre outros benefícios.

Tudo é correio, tudo é papel.

Eu nunca vou me esquecer de quando estávamos na expectativa de assinar o contrato de aluguel desse apartamento: aparentemente, tinha ficado tudo certo e deveríamos receber o contrato para lermos assinarmos e entregarmos na imobiliária. Passaram-se 2, 3, 4 dias, nada de receber o contrato por email. Resolvemos entrar em contato com o corretor pra saber se houve algum problema, manifestando novamente o nosso interesse no apartamento, ao que ele responde que o contrato tinha sido enviado pelo correio e que deveríamos receber no dia seguinte no hotel residencial onde estávamos hospedados. A partir de então, tivemos que nos acostumar que tudo é feito pelo correio, tudo é feito com muito papel. Recebemos, semanalmente, muitos encartes dos supermercados, mesmo já tendo pedido pra que não nos sejam enviados, já que eu consigo ver todas as ofertas online. Aliás, eu acho que os correios deveriam receber toda uma categoria neste post dedicada a eles, mas eu vou me limitar a dizer que os suíços confiam muito nos correios e dependem muito dos correios pra tudo, e nem sempre tem uma lógica nas entregas: as vezes eles interfonam avisando que chegou alguma coisa, as vezes é um silêncio absoluto e eu que lute pra descobrir se o que eu tô esperando foi entregue (tá, nem é tanta luta assim, é só entrar no rastreio que vai tá lá escrito, mas é que eu acho estranho eles só avisarem pelo interfone as vezes; pra mim, ou avisa sempre ou não avisa nunca! hihihihi).

Você pode pagar (quase) tudo por boleto.

Ah, os boletos. Aqui na Suíça, eles são laranja e devem ser pagos somente nas agências dos correios. Não, você não leu errado: por aqui, não existe a opção de ir no banco pagar um boleto. É possível pagar um boleto pelo internet banking, ou indo até uma agência dos correios. E tudo é boleto. Compra online pode ser paga por boleto. Supermercado pode ser pago por boleto. Aluguel de apartamento e vaga de garagem podem ser pagos por boleto. Dentista e consulta médica podem ser pagos por boleto. Óculos de grau pode ser pago por boleto. Quando eu fui fazer um check up, eu queria pagar na hora, mas simplesmente não consegui porque o sistema de pagamento deles é por envio de boleto, que poderia demorar até 2 meses(!) para chegar. Aqui, a lógica é que, se você tem um endereço na Suíça, o mais conveniente é receber um boleto (via correio, claro) para pagar pelas suas coisas. Você sempre tem, no máximo, 1 mês para pagar o boleto recebido – eu prefiro SEMPRE pagar no mesmo dia que recebo, que é pra não correr risco de ter complicação. E, sabendo como eles adoram um papel, eu nunca me esqueço de imprimir as confirmações de pagamento.

O verão é quente demais.

MEU DEUS DO CÉU. Que calorão!! Eu estava doida pro outono chegar – e chegou com tudo, com temperaturas de 3ºC na primeira semana. Mas, olha, que verão horrível. É lógico que a experiência do verão também foi prejudicada pela pandemia do coronavírus, já que eu mais fiquei em casa do que qualquer outra coisa, e as casas/aptos suíços são projetados para reter calor. Se tivesse sido um verão normal, saindo pra passear, andar na beira do rio, curtir o pôr do sol, sentar nas mesas externas dos restaurantes pra comer, essas coisas assim, talvez eu tivesse gostado um pouquinho. Quem sabe no ano que vem? Porém devo confessar que não tenho muita expectativa de gostar de verão porque eu nunca gostei de calor na minha vida.

Não dá pra evitar (conversas com) os vizinhos.

Vizinhos gostam de conversar, nem que seja parado na escada. É, eu sei, tem dias que a gente sai meio na correria, tem dias que a gente não tá muito pra conversa (o que pode ser potencializado se a conversa é num outro idioma que você não domina). Mas aqui, pelo que eu aprendi, não tem jeito: se eu cruzar com algum dos meus vizinhos na escada, ou na caixa de correio, ou na área da “garagem” (que, aqui, é diferente do conceito de garagem com o qual eu sempre estive acostumada), ou mesmo na lixeira, eu com certeza vou ter que parar e conversar com eles. E os vizinhos apreciam MUITO pequenas gentilezas, tipo um cartãozinho desejando bom final de semana ou coisas assim.

Não existe um “alemão suíço”, mas vários.

Todo mundo sabe que alemão é uma língua cheia das complicações. Geralmente, o alemão que estrangeiros aprendem é o “alemão padrão” (Standarddeutsch/Standardhochdeutsch/Hochdeutsch – tá vendo, uma língua que tem 3 jeitos de chamar a mesma coisa não é nada simples!), que com certeza vai te ajudar a ser compreendido em qualquer lugar onde se fale alemão. MAAAAAAS se, dentro da Alemanha, há vários jeitos diferentes de se falar alemão, a Suíça também não ia ficar de fora e é claro que há vários jeitos de se falar alemão na Suíça, mesmo sendo um país minúsculo, mesmo sendo um país com 4 idiomas oficiais. O alemão que se fala aqui em Berna, por exemplo, é diferente do alemão que se fala em Zurique. O que eu noto é que essas diferenças não impedem a comunicação mas, em geral, os interlocutores adaptam o alemão que estão falando pra que o outro tenha compreensão. E num país com 4 idiomas oficiais….

Tá liberado misturar italiano com francês com alemão (não necessariamente nessa ordem).

Eu nunca vou esquecer do dia que eu tava no ônibus e observei duas senhoras conversando: uma falava em alemão, a outra respondia em francês. E assim elas conversaram muito tranquilamente o trajeto inteiro. De acordo com minhas observações, o costume suíço é se expressar no idioma (oficial) que você se sente mais confortável. O alemão suíço “rouba” várias palavras do francês (e algumas do inglês, mas isso são outros 500), e eu já me liguei que, se eu não souber alguma palavra em alemão, eu posso falar em francês que há uma chance de 95% de ser compreendida, o que facilita bastante a minha vida.

Não é todo mundo que fala inglês.

Isso aí foi uma das coisas mais chocantes pra mim, confesso. Nas duas vezes que eu tinha vindo pra Suíça antes de mudarmos pra cá ano passado, fiquei em Genebra, e eu queria mais era gastar o meu francês. Chegando em Berna, com meu alemão ainda bem capenga (não que hoje esteja tinindo, mas já melhorou consideravelmente), era inevitável que tentássemos falar em inglês com as pessoas, principalmente pra resolver as coisas do apto/carro. E, meu Deus do céu, que dificuldade! Em Berna, era mais fácil eu me resolver em italiano do que em inglês. Lógico que, pensando em estrutura turística, você vai conseguir se comunicar em inglês. Mas, para o dia a dia, eu percebi que o alemão seria ainda mais importante aqui do que o russo era na Armênia.

Viajar não é tão fácil assim.

Uma das coisas que mais nos animava antes de chegarmos aqui era a possibilidade de viajarmos pela Europa – o que a gente não imaginava era que sair de Berna não é tão fácil assim. Pensando num mundo sem coronavírus (afinal de contas, quem podia imaginar?!), nossos planos incluíam viagens aos finais de semana (nem que fosse uma vez no mês) para países vizinhos/próximos. Mas logo logo vimos essa expectativa se frustrar, já que as conexões ferroviárias saindo de Berna são bem poucas e em horários pouco convenientes, e os horários de voos saindo de Zurique (o aeroporto mais próximo, que fica a quase 1h30 de trem) não ajudam quem está na capital da Suíça e quer dar uma escapadinha de fim de semana. Por sua vez, viajar dentro da Suíça é sempre bem fácil, seja pelas excelentes conexões ferroviárias, seja pelas estradas im-pe-cá-veis.

Coronavírus mudou tudo.

Impossível não refletir sobre esse aspecto, que mudou absolutamente TUDO. É claro que isso aconteceu pra todo mundo no mundo todo, mas eu não consigo evitar de pensar no impacto que a pandemia causou em diversas esferas da minha vida, da nossa vida aqui. A começar pela Universidade: por exemplo, eu achava que conseguiria formar um círculo de conhecidos (falar em círculo de amizades é algo complexo quando se mora tão pouco tempo em um lugar, e mais complexo ainda se tratando de uma sociedade mais fechada como é a Suíça), compartilhando as angústias e as alegrias da pesquisa de doutorado nas aulas, e é lógico que eu tive que me conformar com as aulas e seminários virtuais. As viagens, também, foram completamente comprometidas, mesmo dentro da Suíça. Meu Deus, eu mal tenho coragem de ir a pé ali no centro, vê se eu vou ter coragem de viajar pra um lugar turístico, me hospedar num hotel, etc? E não foram só as nossas viagens que foram afetadas: nossos pais ainda não conseguiram vir nos visitar, o que é algo muito, muito esquisito. Em tempos de coronavírus, lidar com a saudade é um desafio diário.

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