Pode parecer uma doideira dizer que só agora em maio é que meu ano parece ter começado de verdade, depois de um final de semana em Roma em janeiro, 40 dias no Brasil entre fevereiro e março, 1 mês dos meus pais aqui conosco, um pulo em Portugal, e mais 10 dias das minhas sogra e cunhada aqui. Mas a verdade é que é essa a sensação, que só agora meu ano vai começar pra valer, e que a rotina finalmente vai tomar forma, e que eu vou dar conta de tudo o que preciso fazer em 2023.
E é nesse espírito de recomeço que eu quero contar pra vocês de um dos passeios mais legais que fizemos com meus pais: nosso roteiro de 2 dias pela região da Galileia. Eu já tinha passado rapidamente pela Galileia em 2011, quando vim pra Israel e Palestina com a LaSalle, mas só tinha ido a 2 dos lugares que visitamos (por coincidência, os 2 primeiros que fomos com meus pais). A região da Galileia abriga vários lugares importantes para os cristãos; afinal, Jesus também era conhecido como “Nazareno” ou “Galileu”. Como cristãos católicos, estávamos bastante animados para desbravar essa região onde Jesus passou a maior parte da Sua vida.

Nossa primeira parada foi Yardenit, um local onde são realizados batismos no Rio Jordão. É importante lembrar que o local aceito como lugar do Batismo de Jesus fica na Jordânia: na tradição cristã, o batismo de Jesus (Mateus 3, 13-17) aconteceu em Al-Maghtas (Betânia além do Jordão), ao norte do Mar Morto e ao leste de Jericó. Durante vários séculos, Al-Maghtas foi o local de batismo mais importante para os peregrinos, e muitos mosteiros e pousadas foram criadas em seu entorno.


Desde a Guerra dos Seis Dias, Israel ocupa a margem oeste do Rio Jordão. Por conta das atividades militares e escavações naquela parte da Cisjordânia, o Ministério do Turismo Israelense criou o Yardenit em 1981 como lugar alternativo para peregrinação, o qual se tornou o primeiro lugar regularizado para batismos em Israel. Lá, há um centro de visitantes, e uma lojinha com diversos souvenires da Terra Santa.

Ao sairmos de lá, fomos almoçar no restaurante Tanureen, que fica em Migdal, cidade às margens do Mar da Galileia onde nasceu Maria Madalena. A comida estava excelente, em quantidade suficiente para alimentar um batalhão!
Seguimos margeando o norte do Mar da Galileia, rumo à Igreja da Multiplicação dos Pães e Peixes, em Tabgha. Como o nome já diz, esta Igreja foi construída no local onde Jesus disse “Dai-lhes vós mesmos de comer” (lema da Campanha da Fraternidade de 2023), e multiplicou os 5 pães e 2 peixes que os Seus discípulos tinham para que toda a multidão ficasse bem alimentada, como relatado pelo evangelista São Marcos (6, 30-44).



Essa Igreja tem uma história bem interessante, porque foi construída sobre duas igrejas bizantinas anteriores: a primeira, do século IV, e a segunda, do século V. A segunda era maior do que a primeira, e os mosaicos foram adicionados nesta época. No século VII, os persas destruíram as igrejas bizantinas. Depois dessa destruição, o local exato do templo ficou perdido por cerca de 1300 anos! Em 1888, a Sociedade Alemã Católica para a Palestina (Palästina-Verein der Katholiken Deutschlands) comprou as terras, iniciando as explorações arqueológicas em 1892 e as escavações em 1932. Tais escavações revelaram os pisos em mosaico da igreja do século V, e também os pilares fundamentais da pequena capela do século IV.



A igreja atual, inaugurada em 1984, foi construída obedecendo a planta da igreja Bizantina do século V, aproveitando que algumas das antigas paredes de basalto preto sobreviveram e permanecem visíveis até hoje. Os arquitetos alemães responsáveis por esse projeto de reconstrução desenharam uma igreja simples e modesta, com resquícios do estilo neobizantino. As janelas tem painéis de alabastro, as pedras de calcário foram levadas de uma pedreira perto de Taybeh (entre Jericó e Ramalá), os tijolos vermelhos vieram da Itália, e as vigas de madeira do telhado vieram da Alemanha.
Os mosaicos são os destaques da igreja, principalmente aquele aos pés do altar, que reproduz a imagem dos 2 peixes e 5 pães multiplicados por Cristo. Vale destacar que os mosaicos na igreja de Tabgha são os mais antigos exemplos desse tipo de arte cristã na Terra Santa.
Embora Tabgha seja bem próximo do sítio arqueológico de Cafarnaum, nós fomos primeiro para o Monte das Bem Aventuranças, porque dizia o Google que lá fechava mais cedo do que o sítio arqueológico. Para a fé Cristã, foi no topo desse monte que Jesus fez o famoso Sermão da Montanha, contado pelo evangelista São Mateus nos capítulos 5, 6 e 7.


A Igreja que fica no topo do Monte junto ao Mar da Galileia foi construída entre 1936 e 1938, próxima ao lugar onde havia uma pequena igreja da era Bizantina, que datava do final do século IV.


Essa Igreja é bastante interessante por vários motivos, dos quais destaco 3: primeiro, pelo seu formato octogonal, com cada um dos seus oito lados representando as oito Bem Aventuranças; depois, pelo seu estilo neobizantino, com revestimento de mármore nas paredes internas inferiores e mosaico dourado na cúpula; por fim, pelos símbolos em mosaicos no piso ao redor do altar, representando a Justiça, a Prudência, a Fortaleza, a Temperança, a Fé, a Esperança e a Caridade.
Para fechar esse dia intenso refazendo alguns passos de Jesus pela Galileia, fomos até o sítio arqueológico de Cafarnaum. Lá, vimos ruínas que datam da época de Jesus, encontradas após escavações intermitentes ao longo dos anos.



Em 1838, o explorador norte-americano Edward Robinsou descobriu as ruínas que ele identificou como uma sinagoga, mas sem tê-las relacionado à cidade de Cafarnaum. Em 1866, o inglês Sir Charles William Wilson identificou o local como Cafarnaum. Em 1984, o Frei Franciscano Giuseppe Baldi, então Guardião da Terra Santa, conseguiu comprar boa parte das terras ao redor das ruínas. Outros pedaços de terra na porção leste foram adquiridos pelo Patriarcado Grego Ortodoxo de Jerusalém.

Em 1905, os alemães Heinrich Kohl e Carl Watzinger começaram um estudo das sinagogas da Galileia, continuados pelos Padres Franciscanos Vendelin von Benden (1905-1915) e Gaudenzio Orfali (1921-1926). As escavações resultaram na descoberta de dois prédios públicos: a sinagoga, que foi parcialmente restaurada pelo Frei Orfali, e uma igreja octagonal.


Em 1968, Virgilio Corbo e Stanislao Loffreda recomeçaram as escavações da porção oeste das terras franciscanas. Nesta fase, a principal descoberta foi uma casa do século I, que os cristãos acreditam ter sido a casa de São Pedro. A porção leste das terras, propriedade do Mosteiro Ortodoxo dos Santos Apóstolos, centrada na Igreja dos Santos Apóstolos, com a cúpula vermelha, foi analisada e parcialmente escavada sob comando do grego Vassilios Tzaferis. Esta seção descobriu uma vila dos períodos Bizantino e inicial Árabe, incluindo uma piscina aparentemente usada para o processamento dos peixes, e um tesouro de moedas de ouro.








Um dos destaques do sítio arqueológico de Cafarnaum certamente é a sinagoga onde Jesus começou Seu ministério, e que o Frei Franciscano Orfali começou a restaurar em 1926. De acordo com o evangelho de São Marcos (1, 21-39), Jesus entrou na sinagoga assim que chegou a Cafarnaum, e lá começou a ensinar. Depois de expulsar um espírito mau de um homem que lá estava, Ele foi para a casa de Simão Pedro, onde curou a sogra dele. E é a casa de Pedro o outro grande destaque deste sítio arqueológico, complementada pela igreja octogonal construída logo acima. Esta igreja octogonal tem um piso de vidro bem ao centro, através do qual podemos ver os resquícios da casa de São Pedro.



Aproveitamos que lá era a última parada do nosso dia e ficamos curtindo o visual do Mar da Galileia com tranquilidade antes de seguirmos pra Nazaré, onde passamos a noite.

No dia seguinte, Domingo de Ramos, fomos pra Basílica da Anunciação. Eu confesso que há meses estava doida pra ir lá, então estava bastante ansiosa pra conhecer o lugar onde o Anjo Gabriel anunciou à Virgem Maria que ela seria a Mãe de Deus, de Nosso Senhor Jesus Cristo.



De acordo com a tradição cristã, o Imperador Constantino I encomendou a estrutura da Igreja da Anunciação. Sua mãe, Santa Helena, ajudou a fundar as igrejas nos locais onde Jesus vivenciou momentos importantes da Sua vida. A Igreja da Anunciação foi fundada mais ou menos na mesma época da Igreja da Natividade e da Igreja do Santo Sepulcro.



A Basílica estava absolutamente LOTADA tamanha concentração de fiéis para a celebração da festa de Ramos. Ainda assim, foi lá que vivemos alguns dos momentos mais lindos da viagem dos meus pais. Primeiro, na Igreja de São José, construída sobre as ruínas do que foi a casa de São José e da sua carpintaria. Depois, quando conseguimos descer para a Igreja da Anunciação, logo abaixo da Basílica. O altar da Igreja fica bem à frente das ruínas da casa que Nossa Senhora morava e onde recebeu a visita do Anjo Gabriel. A emoção de estar nesses lugares é difícil de descrever.


Certamente, não poderíamos ter iniciado a Semana Santa de maneira mais maravilhosa! Foi um final de semana inesquecível.