– What do you want, Michael?
– I don’t know, I want something that isn’t this. But at the same time, I really want the other stuff too.
Eu tinha uns 13 anos quando joguei GTA III pela primeira vez.
Cheguei da escola trazendo na mochila o CD-Rom de instalação do jogo que havia pego emprestado com um amigo. Nas suas palavras, “aquele era o melhor jogo já feito na história dos videogames dos últimos tempos”. Assim mesmo, com todas as hipérboles que tinha direito.
Liguei meu computador, deixei o jogo fazer sua instalação de praxe e esperei. Como quem esperava uma encomenda dos correios ou uma cartinha de amor – não me julguem, eu tinha 13 anos. Amor não era importante naquela época. Até que o Windows apitou o fim e o jogo, enfim, começou.
Precisei de exatos 5 minutos em Liberty City. Foi o tempo suficiente para que eu tivesse a minha primeira morte no jogo, em decorrência de um conflito com a polícia que por sua vez se deu em decorrência de eu ter dado um tiro em um transeunte na rua. E o que aquela pobre pessoa virtual tinha me feito de ruim? Nada, eu só quis mesmo.

Grand Theft Auto nunca foi só um jogo. Era uma parada, um negócio pesado, no melhor linguajar popular. Diferente de quase tudo que havíamos vivido em termos de videogames, GTA jogava com uma experiência diferente: não havia fases, chefões, labirintos. No lugar do modelo padrão de jogos, a Rockstar te oferecia algo maior: liberdade de escolha.
GTA III, até hoje, foi o ápice dessa liberdade. Seus gráficos em 3D permitiam algo ainda inédito nos videogames: somar a liberdade inerente ao tema do jogo com um nível de realidade até então não visto. Era a fórmula do sucesso.
E aquele belo dia de meus trezes anos foi inteiramente consumido por Liberty City. Só não vairei a madrugada porque minha mãe, sempre sábia, me obrigou a estudar com meia dúzia de esporros.
Passada a catarse de matar pessoas na rua, enfrentar a polícia e destruir carros, zerei o jogo em não mais que uma semana, um tempo até rápido. E até hoje nunca esqueci de Liberty City.
GTA V
Desde aqueles 13 anos se passaram 11 anos. E de lá pra cá foram muitos jogos, acúmulo de idade e alguns outros GTA’s: Vice City, San Andreas, versões para portáteis, IV, até que finalmente chegamos ao atual: Grand Theft Auto V.
O jogo foi lançado no dia 17 de Setembro último. Vendeu, em 24 horas, mais de 800 milhões de dólares. A versão tupiniquim chegou dois dias mais tarde, dia 19.
Comprei o jogo no dia do lançamento. Cheguei na loja e percebi que não era o único “louco” pelo jogo: vi adolescentes, pessoas da minha idade, mães e até mesmo executivos de terno e gravata ansiosos na fila com o jogo na mão.

O hype se procriava na internet: fotos em redes sociais da capa do jogo acompanhados de piadas como “É o fim da minha vida” se tornaram figurinha carimbada nos dias que se seguiram. Veículos não muito versados em videogames eram obrigados a dar atenção ao que, naquele momento, se tornava o maior empreendimento de entretenimento da história, superando blockbusters como os Vingadores (2012) e Avatar (2009).
As crescentes notas máximas nos mais diversos portais especializados garantiam a excelência de público e crítica – algo que no videogame costuma ser comum, diferente de outras artes. E com isso chegávamos a cabal pergunta: por que GTA é o que é?
A resposta talvez pareça simples, mas a mesma desde a terceira edição da série: liberdade.
O que que eu vou fazer com essa tal liberdade?
O filósofo holandês Baruch de Espinosa, nas suas vindas lá pelo século XVII, dizia que ser livre é o ato de se realizar em sua total plenitude, de acordo com nossas amarras naturais.

Usando a tecla SAP, o que ele pregava era que um ser era livre quando era capaz de fazer tudo o que lhe era permitido pela sua natureza. Assim sendo, um jacaré era livre quando gozava de suas funções de jacaré, como nadar, ficar tomando sol e matar um bicho ou outro de vez em quando. Ele não poder voar, por exemplo, era sua limitação natural.
Para nós, seres humanos, a liberdade também é restrita por leis e por nossa moralidade, o que nos impede de dar uns tiros em alguém se nos fecham no trânsito.

E é aí que GTA brilha: é no jogo que podemos ser livres à la Espinosa! Porque no jogo, no duro, praticamente tudo é permitido. Podemos roubar carros, matar pessoas, atropelar, explodir pessoas com bombas em celulares, invadir bases militares, pular de pára-quedas, pilotar um avião e até mesmo torturar uma outra pessoa. E tudo isso sem o risco de sofrer qualquer tipo de sanção legal ou moral.
GTA é o nosso filme de ação preferido onde nós somos os protagonistas. Se em GTA III isso já era algo inebriante, no V ele alcança sua maestria: sequestrar um avião no ar está, sem dúvidas, no hall das melhores coisas que já fizeram na história dos videogames.
E não, não me entendam mal achando que eu prego que possamos agir como se a vida fosse um GTA. Não, é bom que tenhamos regras e princípios que nos impeçam de cometer qualquer tipo de atrocidade.
Por outro lado, é quase notório o fascínio do ser humano pela violência e sua necessidade de canalizar isso de alguma forma, seja em filmes, sexo ou vendo lutas de MMA sábado a noite. O videogame – e GTA, por tabela – é apenas mais um exemplo nos montes que corroboram isso.
O veredicto
Não se iludam com relatos sobre a história de GTA V, a dinâmica de troca de três personagens, o drama pessoal de cada um deles etc. Isso importa, sem dúvida, mas não é o que te ganha em GTA V. Em narrativa, por sinal, o jogo perde com folgas para seu grande concorrente ao jogo do ano, Last of Us.
GTA V é sobre roubar um carro e cruzar Los Santos em direção à Sandy Shores ouvindo Radio Gaga, do Queen, no rádio; é sobre se esconder em um descampado enquanto inúmeros carros da polícia te procuram sem descanso; é sobre nadar no mar aberto em busca da inevitável morte por tubarão.

É, em suma, a essência da série há mais de uma década: diversão por diversão, sem medo de ser feliz. Soma-se isso ao montante de dinheiro investido na produção, tecnologia e marketing, bem como o crescimento da indústria de videogames e o fenômeno é explicado.
Se isso não basta, fiquem com a fala do psicólogo de um dos protagonistas:
You’re plainly addicted to chaos.
E sim, nós somos.
One response to “Mothafocka GTA is in da house!”
[…] Post originalmente publicado no the geek land blog. […]
LikeLike