ontem fui assistir ao filme “Jogos Vorazes”, adaptação de livro homônimo. o motivo principal que me levou a querer assistir este filme foi porque qualquer merda que falam que é “o novo Harry Potter” ou “um fenômeno comparável a Harry Potter” ou qualquer coisa nesse sentido eu faço questão de assistir – porque, se for pra falar bem, ou se for pra falar mal, eu quero falar com propriedade.
o irmão do meu melhor amigo, também conhecido como Príncipe Infante, leu a série dos livros. já tinha perguntado a ele quais eram as impressões dele sobre a história, e ele me disse, entusiasmado, que era muito legal, e que eu deveria ler.
resolvi, primeiro, assistir ao filme. inclusive, minutos antes de entrar na sala de cinema, estávamos numa Livraria Saraiva (n.a.: não, eu não recebi nada pra fazer propaganda da Saraiva. quem me dera! eu apenas sou uma consumidora assídua), e, vendo aquela multidão de adolescentes entusiasmados, cheguei a considerar ler os livros, caso eu gostasse do enredo mostrado no filme.
seguimos, então, para assistir ao filme. passaram-se mais de 2 horas de uma fita sanguinolenta, apresentada a um público predominantemente jovem (a classificação era 12 anos – e muitos adolescentes estavam lá ocupando os lugares na sala).
o enredo pode ser resumido assim: 24 jovens entre 12 e 18 anos vão pro meio de uma floresta e só um poderá sair de lá vencedor – tendo que matar seus adversários pra sair vivo.
eu não sei o que mais me assustou no filme: as cenas verdadeiramente sanguinolentas, talvez piores do que as mais explícitas batalhas em filmes de guerra, ou o fato de que os adolescentes vibravam a cada morte de um personagem teoricamente menos querido do que outro.
porque, naturalmente, como em qualquer história, existem os personagens ruins e os bons; existe a mocinha, o mocinho, a gangue malvada, tudo está lá. e até o mais crítico dos expectadores acaba torcendo pelos mocinhos em algum momento – nem que seja só pra que eles se beijem logo e parem de postergar o que todo mundo já sabia que ia acontecer.
ao ver toda aquela violência retratada numa tela enorme de cinema, o meu corpo reagia ao que eu estava vendo – fiquei com dores musculares de tanta tensão – ao mesmo tempo em que meu cérebro tentava processar a ideia de que jovens no mundo inteiro, enquanto ainda estão em formação da sua personalidade e caráter, aclamam essa série – ou, pelo menos, acreditam em alguns críticos literários que apontaram a série como um grande fenômeno.
cada cena me lembrava diretamente do Estado de Natureza descrito por Thomas Hobbes. de forma resumida, o Estado de Natureza é compreendido pelos contratualistas como o estágio anterior à construção da sociedade civil. para Hobbes, o Estado de Natureza é qualquer situação onde não há um governo que estabeleça a ordem, e onde todos os seres humanos são inguais no seu egoísmo, fazendo com que a ação de um só seja limitada pela força do outro. o Estado de Natureza é sempre um estado de Guerra – que pode acontecer a qualquer momento e sem causa aparente.
na história que eu assisti retratada naquele filme ontem, existia um governo – Capitol – que controlava 12 Distritos que, outrora, se rebelaram, mas foram contidos. por conta dessa rebelião, foram criados os tais Jogos Vorazes – uma espécie de Big Brother misturada com Torneio Tribruxo, só que cheio de sangue -, objetivando fazer lembrar que a rebelião contra Capitol deveria e deverá ser castigada. só que este governo, ao invés de garantir a sobrevivência dos seus cidadãos, sorteava entre eles os tais 24 Tributos – sempre um menino e uma menina de cada Distrito – para lutar entre si, até a morte.
o que me assusta é a banalização da violência. me assusta ver jovens batendo palmas para cenas em que há morte, sangue jorrando por todos os lados, como se isso fosse algo moralmente aceitável. me assusta pensar que esses jovens podem incorporar determinados aspectos da tal história contada e retratada e resolver sair por aí agredindo uns aos outros, por egoísmo ou voracidade.
sou uma pessoa razoavelmente chegada aos conflitos. gosto de estudar a guerra, gosto de história militar – afinal, se não gostasse, não teria escolhido um curso de mestrado absolutamente militarizado, que é o curso de Estudos Estratégicos da Defesa Nacional e da Segurança Internacional. o período que eu mais gosto da história é também o mais perigoso – a Guerra Fria. se pudesse dar merda, teria dado. porque, né, explodiria uma guerra nuclear, minha gente.
pra trazer um pouco mais de empiria pro que estou falando, cito em tradução livre o que Baylis & Wirtz já registraram: a maioria dos estrategistas, por reconhecer a verdadeira natureza da guerra, considera o conflito armado uma tragédia, uma atividade que não deveria ser empreendida por seres humanos, e que deve ser limitada na maior extensão possível.
conversando com o mesmo Príncipe Infante já mencionado neste texto, ele me explicou que, no livro, há uma tangência pra compreender que a história é uma crítica à manipulação que a mídia exerce sobre as pessoas. e isso é perceptível, de fato, mesmo no filme. o que me incomoda é: será que todos os jovens que assistiram/assitirão ao filme ou leram/lerão o livro conseguirão fazer essa abstração? será que não se deixarão ser levados pela emoção e, envolvidos pela voracidade, não tomarão como palatável a ideia de agredir um par para atingir os seus objetivos?
me incomoda que a juventude de amanhã esteja sendo bombardeada com uma literatura e uma filmografia desse tipo. me incomoda saber que o bullying pode estar ganhando respaldo. me incomoda pensar que tantos jovens estão deixando de ver a morte como uma coisa singela, que deve ser tratada com respeito, interpretando-a como uma consequência inevitável a se enfrentar quando se quer conquistar algo.
o primeiro resultado de uma pesquisa rápida no Google da palavra “voraz” indica: o adjetivo significa “que devora, ou come com avidez”. e, ainda: “o lobo é um animal voraz”. Thomas Hobbes já disse que, no Estado de Natureza, o homem é o lobo do homem – uma máxima repetida muitas vezes, e muitas vezes por quem nem sabe direito da onde ela surgiu. nos tais Jogos Vorazes, isso é exatamente o que acontece: os adversários se devoram com avidez. banaliza-se a violência, banaliza-se a morte.
admito que tenho dificuldade de entender um mundo onde a juventude (e, quem sabe, a infância) deixa perder-se num estado de natureza.
ah, é: Jogos Vorazes NUNCA será “o novo Harry Potter” ou “um fenômeno comparável a Harry Potter”. na verdade, nada jamais conseguirá ser comparável a Harry Potter. conformem-se com esta verdade irrefutável, e parem com esta merda.
8 responses to “sobre violência, juventude e o estado de natureza”
Letícia, esse é o mesmo argumento usado para evitar que crianças joguem jogos violentos, jogos de tiro e tudo mais. Eu acho difícil de acreditar que por você jogar um jogo aonde você mata ou atropela pessoas, você se tornará um psicopata ou um sociopata. Em todas as épocas existem filmes violentos, na nossa infância e juventude nos vimos vários (eu pelo menos), Uma Outra História Americana, Clube da Luta, Rocky, O Silêncio dos Inocentes, entre outros. E isso não formou uma geração de lunáticos assassinos. Além do mais esses filmes que citei são muito melhores que esse tal de Jogos Vorazes, que nunca verá o meu rico dinheirinho, nem tomar minha banda de download com ele. Acho que a falha na educação seja mais problemática do que o entretenimento dos jovens de hoje em dia, que não acredito que seja diferente da nossa época. Assim como eu e você não saímos atirando em ninguém feito loucos, essa juventude também não o fará, o contrato social está incutido em nossas mentes antes mesmo de aprendermos a falar a palavra matar, não se preocupe! eehehehehhee
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You do have a point!
Mas eu fiquei chocada foi com a maneira com que a morte é tratada sem a menor sensibilidade nos Jogos Vorazes, e os infantes aclamavam aquilo.
E, como você mesmo disse, não dá pra comparar Clube da Luta ou O Silêncio dos Inocentes com Jogos Vorazes.
Aliás, pra que eu perdi tempo com esta merda mesmo?
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Cara blogueira, já que uma verdadeira autora não escreveria “ingual”, ignoraria letras maiúsculas em inícios de parágrafos e escreveria uma pseudo-crítica, porque esta não passa de pseudo, sem ter feito uma pesquisa adequada, e não apenas perguntando ao irmão do amigo, por essa resposta, gostaria de defender o filme, a história e a fan-base, injustamente acusada por você. Antes de tudo, não sou um fã die-hard, sou um fã crítico e sei reconhecer quando uma história é boa ou ruim, mesmo gostando dela ou não. Outro esclarecimento, também sou um grande fã da série Harry Potter, mais ainda do que de Jogos Vorazes. A começar pelo trecho em seu primeiro parágrafo: “qualquer merda que falam que é “o novo Harry Potter” ou “um fenômeno comparável a Harry Potter””. Esse trecho mostra o seu fanatismo e protecionismo exacerbado para com Harry Potter, onde, como uma fã de carteirinha, se vê na obrigação de defender sua história favorita quando qualquer outro universo ameaça roubar o título de melhor história infanto-juvenil de todos os tempos, e, sim, eu não tenho vergonha de admitir que Harry Potter foi muito mais além do que Jogos Vorazes. Mas, Jogos Vorazes é uma história completamente diferente. Uma história com bases políticas, diferente da base fantasiosa de HP. Nunca alguém comparou as duas histórias, o que seria idiotice, mas, sim, a inovação das duas e o potencial sucesso que Jogos Vorazes pode ter em comparação a HP. Nem mesmo o público é o mesmo, já que JK focava mais em um público infanto-juvenil e Collins focava mais em um público jovem-adulto, provando, mais uma vez, que você não precisa perder suas noites de sono e construir textos em seu blog pra argumentar o quanto nada vai chegar aos pés de Harry Potter. Não, nada vai chegar, mas Jogos Vorazes não quer chegar e é aí que está a diferença. Enquanto Harry Potter é uma linda história de, basicamente amor, unindo elementos de fantasia a valores de amizade, Jogos Vorazes é o extremo oposto, uma narrativa construída em um mundo destroçado e sem esperanças, onde não há o mesmo conceito de amor e amizade que há em Harry Potter. Não é uma história para as crianças lerem e sempre terem aquele sentimento de que vai dar tudo certo no final. O diferencial de Jogos Vorazes, em comparação a Harry Potter, é que Collins nunca esteve muito interessada nisso. Na narrativa, o leitor constantemente se preocupa se vai dar tudo certo no final ou não, há, de fato, esta dúvida. Katniss não veio pra tomar o lugar de Harry, como heroína. Ambos são heróis diferentes, Harry representava a luta do bem contra o mal, em um mundo onde o mal é evidente, enquanto Katniss representa uma luta política. Jogos Vorazes passa uma lição diferente. Collins objetivava transmitir a mensagem para seus leitores de que deve-se lutar pelos seus princípios, deve-se se levantar e combater qualquer forma de governo que tentar impedir seu povo de ser feliz. Deve-se, acima de tudo, combater a fome. E a ignorância, no seu caso, já que você falou do significado de voraz como se os participantes tributos se devorassem com voracidade em uma arena, e não floresta. Na verdade, cara blogueira, voraz, nesse caso, fala explicitamente da fome que os habitantes de Panem sofrem nas mãos da Capital, e não Capitol. Sim, ALGUNS tributos nos Jogos matam e comemoram, treinam para matar, mas isso é mais uma crítica a uma sociedade que prepara seus jovens para serem violentos, para apoiarem situações de guerra e conflitos. O livro e o filme, mas o livro mais explicitamente, representam uma crítica forte ao totalitarismo, ao espetáculo da violência e a banalização da morte, se tivesse feito sua pesquisa corretamente, e não apenas o irmão do seu melhor amigo, teria entendido isso. Fica claro no seu texto, blogueira, a sua implicância surgida da possibilidade, inexistente por diferenças na história e não incapacidade de uma parte ou outra, de uma série passar a outra como sucesso crítico. Para sua informação, cara blogueira, Jogos Vorazes não é Battle Royale (se não sabe o que é, procure e procure bem, diferente de todas as suas “pesquisas” para esse artigo), Jogos Vorazes é uma crítica e tem fundamentos políticos, uma história de guerra, sim, sanguinolenta, mas intelectual, não é qualquer merda. Quanto a suas reclamações das cenas que envolviam muito sangue, veja de novo a cena da morte de Severo Snape em Harry Potter e as Relíquias da Morte, parte 2, mas eu creio que você, como uma verdadeira fã, irá se lembrar do sangue envolvido na cena, que foi uma cena forte e impactante. Sim, essa cena nem se compara a violência retratada em Jogos Vorazes, mas Harry Potter NUNCA foi uma história imune de mortes e violência, talvez na fase inocente, ainda no primeiro livro, mas depois disso, não houve um livro sequer em que não houve uma morte, ao menos. Não, blogueira, Harry Potter não é a melhor coisa que já foi feita, sinto em te desapontar e, não, o mundo não está querendo fazer um sucessor para a série, Collins não escreveu sua série com base em Harry Potter. NÃO, os Jogos não são uma mistura de Big Brother e Torneio Tribruxo, uma comparação tremendamente rude e ignorante, uma ofensa tanto para os fãs de Rowling quanto para os fãs de Collins. Os Jogos, para sua inspiração foram idealizados com base em reality shows, adolescentes em guerras e o mito de Teseu, mas NUNCA, Harry Potter, pare com essa mania de perseguição. E, “esta merda”, para sua informação, é uma série aclamada pela crítica e até mesmo por Stephen King, o rei da literatura de terror, que, eu não tenho dúvidas, de que JK é uma fã deste. Essa merda, foi elogiada tanto nos cinemas e nas páginas de livros, ambos recebendo críticas ótimas de jornais de peso como o New York Times. Então, blogueira, antes de fazer uma crítica boba e sem fundamentos, procure saber da “merda” que está falando.
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Só é uma pena que tenha gente nesse mundo que precise se esconder atrás do anonimato pra defender suas opiniões, nem que seja com argumentos aceitavelmente construído.
E, como o blog é meu, eu posso escrever a MERDA que eu quiser nele.
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Cara L, cada um é cada um e, por isso, optei por não revelar a minha identidade, não por vergonha, porque se soubesse quem sou eu, isso não mudaria nada na sua vida ou na minha, por isso mesmo me “escondo” atrás dessa identidade virtual, porque a minha identidade real não tem relevância nenhuma em ser revelada aqui. E, como eu disse, cada um é cada um, e você tem todos os seus motivos para não ter gostado da série ou da violência retratada nela, só gostaria de advertir-lhe que não escrevesse as suas “merdas” sem ter total conhecimento por elas. É um conselho que te dou, não estou procurando criar inimizades, foi apenas uma dica para você, para o seu bem. Mas, se quiser ser apenas mais uma blogueira alienada que sai por aí escrevendo o que bem entender em textos pseudo-intelectuais e fazendo críticas sem fundamentos, vá em frente, seja apenas mais uma na massa. Você é livre para fazer suas críticas, mas se quiser falar qualquer merda, poupe seu tempo, fale no twitter mesmo. Livre para fazer suas críticas, sim, mas escrevê-las sem consentimento da história em questão é uma lástima. É como fazer uma crítica a um álbum que você nunca ouviu ou a um show que nunca foi. Não, eu nunca vim aqui para criticar você ou o seu blog, mas sim o seu post fundamentado em pesquisas mal feitas e uma implicância surgida da sua paixão incondicional por Harry Potter e sua necessidade de defendê-lo perante a qualquer ameaça que surge por aí, mas isso não vem ao caso. Enfim, se quiser continuar escrevendo suas “merdas” sem fundamentos sólidos, vá em frente, não sou eu que vou ficar entrando aqui para ler mais besteiras. Atenciosamente, LV.
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Eita, Lê!!!!! Quando divulguei seu blog não estava querendo trazer problemas para vc!!!! :S espero que não fique chateada! Deixa rolar, nem sempre as coisas que escrevemos agrada a todo mundo! Você nem divulgava seu blog e lá fui eu me meter quando não fui chamada!
heheheheheh… Espero que isso não te desanime para continuar escrevendo, já que sou fã dos seus textos, espero poder continuar lendo, lendo e lendo seu jeito doce e próprio de escrever! Continue dando suas opiniões e falando sobre o mundo como você o vê!
Não pensei que uma opinião diferente e pessoal sobre Jogos Vorazes (que ainda não li e não vi), iria trazer tanta polêmica! Me desculpa, lindinha!!!!! E continue escrevendo, continuarei SEMPRE acompanhando! Beijossss
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Nanda, não há do que se desculpar. O que você tem feito é só me incentivar a desenvolver minha imaginação e minha habilidade em escrever, e eu só tenho a agradecer!
Haters gonna hate. E eu não vou mudar por causa disso.
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Não sou hater, L, só dei a minha opinião, assim como você deu a sua.
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